Os primeiros Homeopatas
Ainda não existia Allan Kardec no mundo filosófico e Sr. Léon Rivail era apenas um ilustre professor de Humanidades em Paris, e já a Corte do Império Brasileiro possuía um núcleo neoespiritualista, formado de elementos cultos e de responsabilidade, que irradiava por todo o país, por toda a América do Sul e até pela Europa as ondas do seu saber. A esse núcleo de cientistas se deve, somos o primeiro talvez a afirmá-lo, o preparo do terreno, onde mais tarde seria lançada a semente do Espiritismo. Era o círculo homeopático.
Desde 1818, (Dr. Galhardo, História da Homeopatia) o Brasil principiara a ouvir falar da Homeopatia. O Patriarca da Independência correspondia-se com Hahnemann. A história não registra ainda o nome dos adeptos senão a partir de 1840, ano em que chegaram ao Brasil dois homens extraordinários, que não devem ser esquecidos pelos espíritas: Bento Mure, francês, e João Vicente Martins, português, depois brasileiro. A ação desses dois super-homens não pode ser contada aqui. Baste dizer: tudo quanto é raiz, tudo quanto é tronco, tudo quanto é galho na frondosa árvore homeopática brasileira, tudo se deve aos dois pioneiros. Outros gozaram as flores, os frutos, o perfume. Outros plantaram em campos novos as sementes colhidas.
Bento Mure e Martins eram profundamente neoespiritualistas. Ambos possuíam o dom da mediunidade. Mure, clarividente e Martins, psicógrafo.
Não se conheciam então as leis metapsíquica (Ainda não existia a Doutrina Espírita). Reinava o empirismo nos trabalhos de inspiração. Mas quem ler Mure (Filosofia Absoluta) verificará que, antes de chegar a nós a Doutrina dos Espíritos, ele se dava a transes mediúnicos. Foi devido a uma assistência invisível constante que puderam os dois, numa terra estranha e ingrata, que tanto amaram, amargar um apostolado inesquecível, recebendo em paga do bem que faziam o prêmio reservado aos renovadores: a perseguição, os ataques traiçoeiros, as ofensas morais e o encurtamento da própria vida. Foram os maiores médicos dos pobres, que o Brasil conheceu. É ainda a Martins que devemos a introdução, em nosso país, das irmãs de caridade e dos princípios vicentinos (1843). Ambos tinham como divisa Deus, Cristo e Caridade. Em 1848, Mure deixou o Brasil para não mais voltar. Martins assumiu sozinho a direção da propaganda, atraindo grande número de adeptos para a Homeopatia. Entre estes lembramos dois nomes, que se tornaram notáveis também, como pioneiros, no Espiritismo: Melo Morais e Castro Lopes.
A cura homeopática envolvia, como envolve ainda hoje, certo mistério para o leigo. Nada mais estranho do que a ação rápida, segura e suave de um medicamento diluído até o absurdo. O médico mais materialista, mais ateísta, aparecerá sempre diante do doente, com uma auréola de misticismo. "Aquilo não pode ser ciência humana": é a ideia popular. Ora, Bento Mure e Martins falavam ainda em Deus, Cristo e Caridade quando curavam e quando propagavam. Aplicavam aos doentes os passes como um ato religioso. Não o faziam por charlatanismo. Hahnemann recomendava esse processo auxiliar da Homeopatia. Foram os homeopatas que lançaram os passes, não os espíritas. Estes continuaram a tradição.
Esse ambiente era favorável às ideias espíritas, que principiaram a irradiar, em 1848, da América do Norte. Não é para estranhar, portanto, que os primeiros experimentadores das mesas girantes tivessem saído das fileiras hahnemanianas.
É interessante constatar que José Bonifácio de Andrada e Silva aparece na História da Homeopatia e na História do Espiritismo, em nossa terra, como dos primeiros experimentadores. Contudo, o grupo espírita mais antigo, que se teria reunido no Rio de Janeiro, foi o de Melo Morais, homeopata e notável historiador. Isso se teria dado antes de Kardec, por volta de 1853, segundo uma tradição, que o Reformador de 1° de maio de 1883 registrou. Frequentavam esse grupo o Marquês de Olinda, o Visconde de Uberada, o General Pinto "e outros vultos notáveis da época". Por isso, o primeiro período espírita é contado desse ano até 1863.
O segundo, de 1863 a 1873, o terceiro de 1873 a 1883. O quarto é contado de 1884 a 1894, o quinto 1894 a 1904, o sexto de 1904 a 1914. Neste trabalho em torno de Bezerra de Menezes, para bem o destacar, é necessário recordar rapidamente esses períodos, exceto o último.