07 março 2024

Belo exemplo de caridade Evangélica


Um lance de caridade realizado pelo Sr. Ginet, caminhoneiro de Saint-Julien-sous-Montmelas, é contado pelo Écho de Fourvière:

No dia 1º de janeiro, ao cair da noite, achava-se agachada na praça de Saint-Julien uma mendiga profissional, coberta de chagas infectas, vestida de velhos trapos cheios de bichos e, não obstante isso, todos a temiam; não respondia ao bem que lhe faziam senão por socos e injúrias. Tomada de súbito enfraquecimento, teria sucumbido na calçada, não fosse a caridade do nosso caminhoneiro que, dominando a repugnância, tomou-a nos braços e a levou para sua casa.

Esse pobre homem tem apenas um alojamento muito apertado, para si, a mulher doente e três filhos pequenos; não tem outro recurso senão o seu módico salário. Pôs a velha mendiga sobre um pouco de palha dada pelo vizinho e dela cuida toda a noite, procurando aquecê-la.

Ao romper do sol, essa mulher, enfraquecendo-se cada vez mais, lhe disse: “Tenho dinheiro comigo; eu vo-lo dou pelos vossos cuidados”. E acrescentou estas palavras: “o Sr. cura…(vigário)” e expirou. Sem se preocupar com o dinheiro, o caminhoneiro correu para procurar o cura; mas era tarde demais. A seguir apressou-se a avisar os parentes, que moram numa paróquia vizinha e que estão em posição folgada. Estes chegam e a primeira palavra é esta: “Minha irmã tinha dinheiro consigo; onde está? E o caminhoneiro responde: Ela mo disse, mas não me inquietei.” Procuram e encontram, com efeito, mais de 400 francos num de seus bolsos.
 
Acabando a sua obra, o caridoso operário, auxiliado por uma vizinha, amortalha a pobre morta. Algumas pessoas eram de opinião que na noite seguinte ele colocasse o caixão num hangar vizinho, que estava fechado. “Não, disse ele; esta mulher não é um cão, mas uma cristã.” E a velou toda a noite em sua casa, com a candeia acesa.

Às pessoas que lhe exprimiam admiração e o aconselhavam a pedir uma recompensa, respondia: “Oh! não foi o interesse que me levou a agir. Que me deem o que quiserem, mas nada pedirei. Na posição em que estou, posso encontrar-me no mesmo caso e seria muito feliz se tivessem piedade de mim.”


— Que relação tem esse fato com o Espiritismo? Perguntaria um incrédulo. — É que a caridade evangélica, tal qual a recomendou o Cristo, sendo uma Lei do Espiritismo, todo ato realmente caridoso é um ato espírita, e a ação desse homem é a aplicação da Lei de Caridade no que ela tem de mais puro e mais sublime, porque ele fez o bem, não só sem esperança de retribuição, sem pensar em seus encargos pessoais, mas quase com a certeza de ser pago com ingratidão, contentando-se em dizer que, em semelhante caso, quereria que tivessem feito o mesmo por ele. Este homem é espírita? — Ignora-mo-lo, mas não é provável. Em todo o caso, se não o era pela letra, era-o pelo espírito. — Se não era espírita, então não foi o Espiritismo que o levou a esta ação? — Seguramente. — Então por que o Espiritismo quer o mérito desta ação? — O Espiritismo não reivindica em seu proveito a ação desse homem, mas se vangloria de professar os princípios que o levaram a praticá-la, sem jamais ter tido a pretensão de possuir o privilégio de inspirar bons sentimentos. Ele honra o bem em qualquer parte onde se encontre; e quando seus próprios adversários o praticam, ele os oferece como exemplo aos seus adeptos.

É lamentável que os jornais sejam menos pressurosos em reproduzir as boas ações, em geral, do que os crimes e os escândalos. Se há um fato que testemunha a perversidade humana, pode-se estar certo de que será repetido linha por linha, como incentivo à curiosidade dos leitores. O exemplo é contagioso; por que não pôr antes sob os olhos das massas o exemplo do bem, em vez do mal? Há nisso uma grande questão de moralidade pública, que trataremos mais tarde, com todos os desenvolvimentos que comporta.

Allan Kardec.
Revista Espírita, outubro de 1868.

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