23 novembro 2019

Primeiros Discípulos


Jesus e discípulos
Daí a algum tempo, depois de haver passado por Nazaré, descansando igualmente em Caná, Jesus se encontrava nas circunvizinhanças da cidadezinha de Cafarnaum, como se procurasse, com viva atenção, algum amigo que estivesse à sua espera.
Em breves instantes, ganhou as margens do Tiberíades e se dirigiu, resolutamente, a um grupo alegre de pescadores, como se, de antemão, os conhecesse a todos.
Os pescadores entoavam uma cantiga rude e, dispondo inteligentemente as barcaças móveis, deitavam as redes, em meio de profunda alegria.
Jesus aproximou-se do grupo e, assim que dois deles desembarcaram em terra, falou-lhes com amizade:
Simão e André, filhos de Jonas, venho da parte de Deus e vos convido a trabalhar pela instituição de seu reino na Terra!
André lembrou-se de já o ter visto, nas cercanias de Betsaida, e do que lhe haviam dito a seu respeito, enquanto que Simão, embora agradavelmente surpreendido, o contemplava, enleado. Mas, quase a um só tempo, dando expansão aos seus temperamentos acolhedores e sinceros, exclamaram respeitosamente:
Sede bem-vindo!...
Jesus então lhes falou docemente do Evangelho, com o olhar incendido de júbilos divinos.
O Senhor esboçou um sorriso sereno e, como se adiasse com prazer as suas explicações para mais tarde, inquiriu generosamente:
Quereis ser meus discípulos?
André e Simão se interrogaram a si mesmos, permutando sentimentos de admiração embevecida e, sem hesitarem, sem uma sombra de dúvida, responderam simultaneamente:
Senhor, seguiremos os teus passos.
Jesus os abraçou com imensa ternura e, como os demais companheiros se mostrassem admirados e trocassem entre si ditérios ridicularizadores, o Mestre, acompanhado de ambos e de grande grupo de curiosos, se encaminhou para o centro de Cafarnaum, onde se erguia a Intendência de Antipas. Entrou calmamente na coletoria e, avistando um funcionário culto, conhecido publicano da cidade, perguntou-lhe:
Que fazes tu, Levi?
O interpelado fixou-o com surpresa, mas, seduzido pelo suave magnetismo de seu olhar, respondeu sem demora:
Recolho os impostos do povo, devidos a Herodes.
Queres vir comigo para recolher os bens do céu? Perguntou-lhe Jesus, com firmeza e doçura.
Levi, que seria mais tarde o apóstolo Mateus, sem que pudesse definir as santas emoções que lhe dominaram a alma, atendeu, comovido:
Senhor, estou pronto!…
Então, vamos disse Jesus, abraçando-o.
Em seguida, o numeroso grupo se dirigiu para a casa de Simão Pedro, que oferecera ao Messias acolhida sincera em sua residência humilde, onde o Cristo fez a primeira exposição de sua consoladora doutrina, esclarecendo que a adesão desejada era a do coração sincero e puro, para sempre, às claridades do seu reino. Iniciou-se naquele instante a eterna união dos inseparáveis companheiros.
Na tarde desse mesmo dia, o Mestre fez a primeira pregação da Boa Nova na praça ampla, cercada de verdura e situada naturalmente junto às águas.
No céu, vibravam harmonias vespertinas, como se a tarde possuísse também uma alma sensível. As árvores vizinhas acenavam os ramos verdes ao vento do crepúsculo, como mãos da Natureza que convidassem os homens à celebração daquele primeiro ágape. As aves ariscas pousavam de leve nas alcaparreiras mais próximas como se também desejassem senti-lo, e na praia extensa se acotovelava a grande multidão de pescadores rústicos, de mulheres aflitas por continuadas flagelações, de crianças sujas e abandonadas, misturados publicanos pecadores com homens analfabetos e simples, que haviam acorrido, ansiosos por ouvi-lo.
Jesus contemplou a multidão e enviou-lhe um sorriso de satisfação.
Contrariamente às ironias de Hanã, ele aproveitaria o sentimento como mármore precioso e a boa vontade como cinzel divino. Os ignorantes do mundo, os fracos, os sofredores, os desalentados, os doentes e os pecadores seriam em suas mãos o material de base para a sua construção eterna e sublime. Converteria toda miséria e toda dor num cântico de alegria e, tomado pelas inspirações sagradas de Deus, começou a falar da maravilhosa beleza do seu reino. Magnetizado pelo seu amor, o povo o escutava num grande transporte de ventura. No céu havia uma vibração de claridade desconhecida.
Ao longe, no firmamento de Cafarnaum, o horizonte se tornara um deslumbramento de luz e, bem no alto, na cúpula dourada e silenciosa, as nuvens delicadas e alvas tomavam a forma suave das flores e dos arcanjos do Paraíso…

Chico Xavier/Humberto de Campos, do Livro Boa Nova

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