17 maio 2024

Praticar a caridade e cumprir o mandamento do amor ao próximo*


*Esta crônica mereceu um voto de louvor inserto em ata da Câmara dos Vereadores de Araraquara, a pedido dos então edis Célio Biller Teixeira e Flávio Thomaz de Aquino, que consideraram de “alto valor os ensinamentos na exposição do Irmão Saulo, pregando acima de tudo a liberdade de culto…”. Agradecendo aos vereadores, principalmente porque não eram eles espíritas, Herculano disse: “Essa compreensão humana, que supera os sectarismos exclusivistas do passado, é característica da civilização”. 
 
Conhece-se a árvore pelos frutos — O conceito cristão de Deus — A pele de ovelha e a pele humana. 

O conceito fundamental do Cristianismo é o da paternidade universal de Deus. Por isso é que Deus é único. Os muitos deuses da antiguidade, que dividiam ferozmente os homens, perdem o domínio do mundo, quando Jesus pronuncia a palavra Pai. Até mesmo Jeová, o deus dos exércitos, deixa o seu lugar ao Deus de Amor do Cristianismo. Os privilégios e divisionismos não têm mais razão de ser, diante da parábola do Bom Samaritano e do ensino de Jesus à mulher samaritana. 

O Espiritismo, surgindo na Terra em cumprimento à promessa do Consolador, para restabelecer a pureza do ensino de Jesus, restabelece o conceito cristão de Deus como Pai. Por isso Kardec ensinou, em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, que o nosso lema deve ser: “Fora da caridade não há salvação”. A bandeira sectarista das religiões apegadas ao velho exclusivismo é substituída pela bandeira cristã do “amai-vos uns aos outros”. 

Kardec chega mesmo a esclarecer que não devemos dizer: “Fora da verdade não há salvação”, porque cada qual interpretando a verdade a seu modo, esse lema serviria para perpetuar na Terra as lutas religiosas, que são a própria negação da religião. A caridade, pelo contrário, a todos une e a ninguém condena, como ensinou o apóstolo Paulo. 

Lemos, entretanto, num pequeno e agressivo artigo contra o Espiritismo, esta curiosa afirmação: 
“A pele de ovelha do espírita é a caridade. Fazer o bem e praticar a caridade.” O articulista entende que os espíritas fazem a caridade para perder as almas. São instrumentos do demônio, mas usam as armas do amor. Se ao menos fingissem que fazem a caridade, ainda se compreenderia. Mas não. Em vez de fingir, 
praticam mesmo a caridade e fazem o bem. E nisso está o seu terrível disfarce. Tanto mais terrível, quanto Jesus ensinou que só podemos conhecer a árvore pelos frutos. 

A preocupação do articulista transparece logo mais, quando ele acrescenta que os espíritas usam nomes de santos nos Centros, expõem imagens e fazem orações, para enganar os incautos. Quer dizer que tudo isso só teria uma finalidade: afastar os filhos de Deus do verdadeiro caminho. Acontece, porém, que os espíritas, ao darem nomes de santos a alguns Centros, têm apenas o propósito de homenagear espíritos elevados, que são conhecidos como santos. 

Por exemplo: Santo Agostinho e São Luiz deram comunicações a Kardec, que figuram em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. Por que usaram o título de santo? Porque assim são conhecidos e só assim podiam se identificar. E somente por isso. Não obstante, os organismos dirigentes do movimento espírita são contrários a essas denominações para Centros, justamente para evitar-se a confusão em matéria de princípios religiosos. 

Quanto ao uso de imagens, é puro engano. Espíritas não usam imagens, como os cristãos primitivos não usavam. As imagens só aparecem em agrupamentos espiritistas humildes, de gente sem instrução, apegadas à religião popular que lhe ensinaram na infância. Também no Cristianismo primitivo acontecia isso. Cristãos novos apegavam-se aos ídolos pagãos, por costume e falta de esclarecimento. Mas, na proporção em que o Espiritismo for sendo compreendido, essa gente humilde abandonará as imagens. O Espiritismo ensina que devemos adorar a Deus em espírito e verdade, segundo a lição de Jesus à mulher samaritana.

No tocante à oração, é claro que os espíritas devem fazê-las. Kardec chegou mesmo a publicar um livro de preces. Como acontecia no Cristianismo primitivo, os espíritas repetem a prece do Pai Nosso, ensinada por Jesus, e sabem que a oração é o meio de se elevarem a Deus e se comunicarem com os Bons Espíritos. 

Não se trata, pois, de pele de ovelha, mas da própria pele humana. O homem é filho de Deus e deve dirigir-se a Ele. Kardec explica o sentimento religioso como lei natural, segundo vemos no capítulo sobre a “Lei da Adoração”, em “O Livro dos Espíritos”. O que acontece é que os espíritas aprenderam, no Evangelho, que devem orar de coração puro, sem nenhuma prevenção contra os seus irmãos. Porque Deus é Pai e todos são Seus filhos, seja qual for o caminho religioso que estejam seguindo. 

J. Herculano Pires, do livro O Homem Novo.

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