14 janeiro 2020

Jesus na Samaria


Descendo Jesus, de Jerusalém para Cafarnaum, seguido de alguns dos discípulos, nas suas habituais jornadas a pé, alcançou a Samaria, quando o crepúsculo já se fazia mais sombrio.
Filipe, André e Tiago, estando com muita fome, deixaram o Mestre a repousar junto de uma pequena herdade e demandaram o lugarejo mais próximo, em busca de alimentos.
O Messias, olhando em torno de si, reconheceu que se encontrava ao lado da fonte de Jacó. Envolvida nos revérberos do Sol que ia ceder lugar às sombras da noite que se aproximavam, uma mulher acercou-se do antigo poço e observou que o Mestre lhe ia ao encontro, com a bela e costumeira placidez do seu semblante, e lhe pedia de beber.
 – Como, sendo tu judeu, me pedes um favor a mim, que sou samaritana? – interrogou, surpreendida.
Jesus descansou na interlocutora o olhar tranquilo e redarguiu:
 – Os judeus e samaritanos terão, porventura, necessidades diversas entre si? Bem se vê que não conheces os dons de Deus, porquanto, se houvesses guardado os mandamentos divinos, compreenderias que te posso dar da água-viva.
 – Que vem a ser essa água-viva? - inquiriu a samaritana, impressionada. – Onde a tens, se a água aqui existente é apenas a deste poço?! Acaso serias maior do que o nosso pai Jacó que no-lo deu desde o princípio?
 – Mulher, a água-viva é aquela que sacia toda sede; vem do amor infinito de Deus e santifica as criaturas.
E, envolvendo a samaritana no doce magnetismo de seu olhar, continuou:
 – Este poço de Jacó secará um dia. No leito de terra, onde agora repousam suas águas claras, a serpente poderá fazer seu ninho. Não sentes a verdade de minhas afirmativas, ante a tua sede de todos os dias? Não obstante levares cheio o cântaro, voltarás logo mais ao poço, com uma nova sede.
Entretanto, os que beberem da água-viva estarão eternamente saciados. Para esses não mais haverá a necessidade material que se renova a cada instante da vida. Perene conforto lhes refrescará os corações, através dos caminhos mais acidentados, sob o Sol ardente dos desertos do mundo!…
A mulher escutava, presa de funda impressão, aquelas palavras que lhe chegavam ao santuário do espírito, com a solenidade de uma nova revelação.
 – Senhor, dá-me dessa água! – exclamou interessada.
Mas, ouve! – disse-lhe Jesus. E o Mestre passou a esclarecê-la sobre fatos e circunstâncias íntimas de sua vida particular, explicando-lhe o que se fazia necessário para que a sagrada emoção do amor divino lhe iluminasse a alma, afastando-a de todas as necessidades penosas da existência material.
Observando que não havia segredos para Jesus, a samaritana chorou e respondeu:
 – Senhor, agora vejo que és de fato um profeta de Deus. Meu espírito está cheio de boa vontade e, desde muito, penso na melhor maneira de purificar minha vida e santificar os meus atos. Entretanto, é tal a confusão que observo em torno de mim, que não sei como adorar a Deus. Os meus familiares e vizinhos afirmam que é indispensável celebrar o culto ao Todo-poderoso neste monte; os judeus nos combatem e asseveram que nenhuma cerimônia terá valor fora dos muros de Jerusalém. As discórdias nesta região têm chegado ao cúmulo. Ainda há pouco tempo, um judeu feriu um dos nossos, por causa das suas opiniões acerca da comida impura. Já que tenho a felicidade de ouvir as tuas palavras, ensina-me o melhor caminho.
O Mestre observou-a, compadecido, e exclamou:
 – Tens razão. As divergências religiosas têm implantado a maior desunião entre os membros da grande família humana. Entretanto, o Pastor vem ao redil para reunir as ovelhas que os lobos dispersaram. Em verdade, afirmo-te que virá um tempo em que não se adorará a Deus nem neste monte, nem no templo suntuoso de Jerusalém, porque o Pai é Espírito e só em espírito deve ser adorado. Por isso, venho abrir o templo dos corações sinceros para que todo culto a Deus se converta em íntima comunhão entre o homem e o seu Criador!
Suave silêncio se fez entre ambos. Enquanto Jesus parecia sondar o invisível com o seu luminoso olhar, a samaritana meditava… 

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